quinta-feira, novembro 04, 2004

Meninos

O menino passeia todos os dias, pelo menos três vezes, pois nessas três vezes eu o observo, com seu cachorro. Segura a coleira de um jeito meio mecânico, com o braço esticado e não solto. Mantém um ritmo perfeito no caminhar. Um, dois. Um, dois. O menino sempre me olha com atenção quando me vê. E eu sempre o olho com atenção quando o vejo.
O menino acorda cedo, sei disso porque, às vezes, quando saio de casa pra ir pra faculdade, ele já está na rua. Com seus óculos feios. Nem mesmo os minutos atrasados do display do celular fazem ele passar despercebido.
Acho que sua visão, todas as manhãs, de um certo jeito, me conforta.
Quando não está passeando com o cachorro, o menino está varrendo as ruas. E varre tudinho. Todas as folhas que caem das árvores, em um ciclo interminável contra essa peculiaridade outonal. Ele junta tudo em um canto e eu, já acostumada, desvio - com um gesto largo - do monte formado, pra mostrar pra ele que respeito o que ele faz. Pra mostrar que aquele pequeno gesto não é desnecessário. Embora talvez o seja.
O menino fica tão absorto varrendo que quando a sua avó (ou será mãe?) o chama, ele nem percebe e continua, atentamente. Mais uma folhinha caiu. Fico admirada. Realmente, qualquer um tem a consciência de que pode fazer diferença, mesmo que de formas tão singelas. Digo isso porque o menino de quem falo é um jovem que não sei a idade, deve ter entre 20 e 30 anos, que tem Síndrome de Down.

No início do ano eu fui madrinha de um casamento com um primo meu que também tem Síndrome de Down. A alegria no olhar dele entrando comigo na igreja emocionou a todos. E acho que tiramos tantas fotos quanto os noivos. Foi um dia lindo, uma emoção indescritível. Ele segurava minha mão forte no altar e a gente chorava. E quando dançamos a valsa, o sorriso dele foi uma das visões mais expressivas que já vi.

Tive vontade de escrever sobre essas eternas crianças, tão especiais...

Um comentário:

Anônimo disse...

tenho uma prima com síndrome de down.
e ela eh tão querida, tão fofa!!!
me divirto bastante com ela. hehehe

"em um ciclo interminável contra essa peculiaridade outonal" - adorei!

bju
Fe